sexta-feira, 9 de maio de 2025
Publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
Educação

quarta-feira, 15 de março de 2017

Instituições estaduais de ensino voltam a defender mais participação da União na educação básica

“O clamor dos Estados é que a União faça o complemento maior dos recursos do Fundeb”, disse o presidente do Consed, Idilvan Alencar, em audiência pública, realizada na tarde de ontem, 14, em Brasília. Foto: Agência Câmara

“O clamor dos Estados é que a União faça o complemento maior dos recursos do Fundeb”, disse o presidente do Consed, Idilvan Alencar, em audiência pública, realizada na tarde de ontem, 14, em Brasília. Foto: Agência Câmara

Além de tornar permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), é preciso, também, obrigar que a União aumente a fatia no bolo dos repasses para a oferta do ensino básico do País. O pleito é do presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Idilvan Alencar, e do presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima.

Os dois especialistas reforçaram o pleito na audiência pública, realizada na tarde de ontem, 14, em Brasília, na Comissão Especial do Fundeb que analisa a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 15/2015, na Câmara dos Deputados.  De autoria da deputada Raquel Muniz (PSC-MG) e relatada pela deputada Dorinha Seabra, a proposta torna o Fundeb, criado há duas décadas, em um instrumento permanente de financiamento da educação básica da rede pública.

Pela lei em vigor, os repasses da União teriam de ser no mínimo 10% para o Fundo, percentual que se tornou o teto anual dos recursos canalizados pelo governo federal ao Fundeb, conforme as críticas dos especialistas.

O presidente do Consed considerou o Fundo uma conquista importante para a educação brasileira – ele ressaltou a reserva de recursos para valorizar os profissionais do ensino –, e criticou o fato de a discussão sobre a PEC se limitar somente à permanência dos recursos do Fundeb. Também secretário da Educação do Ceará, Alencar lembrou o apelo que existe nos estados para que a União aumente sua parcela na oferta da educação básica.

Na avaliação de Alencar, a Comissão Especial do Fundeb tem a oportunidade única de pleitear também essa questão.

“O clamor dos Estados é que a União faça o complemento maior dos recursos do Fundeb”, disse o titular do Consed, que fez um apelo aos parlamentares.

“Senhores deputados, não podemos perder a oportunidade histórica de colocar uma complementação maior da União para o Fundeb. Acredito que todos os deputados aqui têm uma relação com os municípios e escutam isso no dia a dia, quando conversam com prefeitos e secretários da educação municipal e estadual.”

Alencar discorreu sobre o contexto atual do Fundeb e destacou a gravidade na capacidade de vários Estados de honrar os compromissos, já que não conseguem fechar as contas, em razão da generalidade da crise orçamentária. Para Alencar, muitos estão “no limite de alerta” e acrescentou que muitas unidades escolares correm o risco, até mesmo, de serem sucateadas diante de escassez de verbas orçamentárias.

O dirigente do Consed acrescentou ainda que os planos de ações articuladas entre Estados e União não aconteceram em 2015 e nem em 2016, apesar da necessidade da manutenção diária na rede pública escolar.

“Nos últimos dois anos são os municípios que estão arcando com essas despesas”, disse. “Eu diria que o drama é nacional”, complementou.

Segundo Alencar, a estrutura física das escolas e da rede da escola pública do País é praticamente antiga e fica difícil reformar escolas com o dinheiro do Fundeb. “Dificílimo também é comprar equipamentos para as escolas, porque a ajuda federal não acontece há dois anos”, acrescentou.

A situação mais crítica nos municípios, de acordo com Alencar, acontece no transporte escolar. “O transporte escolar universitário ‘é um filho sem pai e nem mãe’, porque não tem recursos garantidos e seus impactos recaem sobre as contas dos municípios. Essa é uma questão muito complicada”, exemplificou.

Descumprimento das metas do PNE

Ao abordar esse contexto, o presidente do Consed chamou também a atenção para a incapacidade de cumprimento das metas do Plano Nacional da Educação (PNE). “É importante frisar que o PNE foi debatido amplamente por este País, nos municípios e Estados e, de repente, esse plano vira uma lei, é sancionado, mas não dá conta de cumprir as metas. Nem a ‘meta um’ aconteceu até agora”, disse, destacando a perda dos esforços empenhados. “Quantos profissionais da educação não envolverem energia e tempo nesse processo de discussão?”, questionou.

Alencar citou especificamente a dificuldade de se cumprir a meta 17 do PNE, relacionada à valorização do magistério, mesmo com a lei do piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da educação básica. Segundo ele, hoje o rendimento médio dos profissionais da educação básica é o equivalente a 50% da média de rendimento de outros profissionais.

Carga pesada dos municípios

Com abordagem semelhante, o presidente da Undime, Alessio Costa Lima, reconheceu os avanços do teor da PEC 15/2015, mas também concordou com o presidente do Consed que a discussão sobre a proposta “é limitada”.

O dirigente da Undime lembrou que a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) definem as responsabilidades de cada ente federado sobre a oferta da educação nacional. “Mas percebemos, pela própria redação da Lei, que os municípios, cada vez mais, têm assumido responsabilidade maior na oferta da educação básica, como a quantidade de matrículas. Responsabilidades que muitas vezes ultrapassam tanto suas capacidades financeiras como as condições objetivas de arcar com esse esforço”, criticou.

Apesar dessas responsabilidades sobre “a ideia de um federalismo cooperativo” entre as três instâncias federativas, o presidente da Undime lembrou que, até agora, quase três décadas depois, o regime de colaboração ainda não foi sequer regulamentado e nunca foi colocado de forma clara.

“Na relação entre receitas e investimento em educação, os municípios que são os entes federados mais fragilizados estão sendo responsabilizados pela maior ampliação do atendimento”, criticou Lima.

Para o titular da Undime, o Fundeb é um exercício que caminha na direção de um regime pactuado de colaboração, mas ainda é um movimento tímido. “Temos de normatizar isso e deixar bem claras as responsabilidades, os papéis e as obrigações, sobretudo financeiras. Concordo com o Idilvan (presidente do Consed) que temos de rediscutir e ser mais ousados na construção de uma política de redistribuição de recursos”, recomendou Lima.

Observações da relatora e do MEC

A relatora da PEC 15/2015, a deputada Dorinha Seabra, por sua vez, analisou os comentários, e respondeu que ainda “estamos esquentando” o motor desse debate. “A recorrência em relação à complementação da União é também uma preocupação que temos”, disse.

A relatora lembrou, porém, a queda-de-braço considerável no processo de votação da proposta para o chamado CAQi, conceito de padrão mínimo de qualidade por aluno, que consta do PNE, e recordou que o Ministério da Educação (MEC)  “não queria de forma alguma” que permanecesse a complementação da União no caráter colaborativo, redistributivo e de equilíbrio dos recursos complementares.

“Mas isso não foi diferente no caso do Fundef, quando Palocci (Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda) não queria que definíssemos nem percentual”, lembrou referindo-se ao descumprimento do governo federal aos repasses dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).

“A nossa tentativa é construir um texto que possa superar os desafios”, disse Seabra, chamando a atenção para o momento difícil que o País enfrenta, de crises orçamentária e econômica.

Já o representante do MEC, Marcos Silva Osório, diretor de Valorização dos Profissionais de Educação, em substituição à Secretária da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino do Ministério, considerou bem vinda a discussão sobre a complementação dos recursos do Fundeb na atual conjuntura econômica.

“No momento de crise como a atual, essa discussão sobre a efetividade da execução do regime de colaboração nunca se fez tão presente e necessária. Acho que essa é a hora de sentarmos e vermos quais são os nossos limites”, disse.

Viviane Monteiro – Jornal da Ciência